Cinema e Série
VIRTUOSAS: quando o manual da boa esposa vira ritual de terror
Filme de terror VIRTUOSAS mergulha no terror social das mulheres moldadas para obedecer
Crédito: Festival do Rio
Em VIRTUOSAS, acompanhamos um grupo de mulheres aparentemente perfeitas, seguidoras de um coach que prega o retorno ao “verdadeiro papel feminino”: ser bela, recatada e do lar. Entre sorrisos forçados, vestidos floridos e discursos de obediência, o comportamento de devoção começa a se transformar em algo mais sombrio. A busca pela virtude se torna um ritual — e o que parecia um guia de vida, revela-se um sistema de controle, medo e silenciamento.
As tradwifes como ferramentas de manipulação do patriarcado
O discurso das tradwives faz parecer que há autonomia, mas é apenas mais uma forma de aprisionamento disfarçada de escolha. Não é um movimento de liberdade, e sim de encarceramento simbólico, e agora também literal, nas telas. Os “coachs da virtuosidade” apenas reforçam o que o patriarcado sempre quis: mulheres moldadas, obedientes e com medo de sair do papel que lhes foi imposto.
VIRTUOSAS mostra que o verdadeiro terror não está no sobrenatural. Ele vive nas ideias que tentam transformar a obediência em virtude.
O filme VIRTUOSAS traz para a tela de forma vivaz esse tipo de movimento aterrorizante
Crédito: Festival do Rio
A atriz Bruna Linzmeyer interpreta a excêntrica Virgínia Heinzel, uma coach dos bons costumes que inspira a vida de mulheres cristãs. Ela elabora um retiro chamado Virtuosa VIP e sorteia três mulheres cristãs para participar da primeira edição.
As escolhidas são Germina (Maria Galant), Lorena Canollo (Juliana Lourenção) e Bárbara Rossi (Sarah Motta). Participa também do retiro a assistente de Virgínia, Gorete (Brisa Marques). O evento vai escalonando para um espaço de busca de uma melhor versão da mulher até uma jornada absurda e paranóica.
O elenco feminino do filme é uma potência. Cada atriz entrega nuances que vão muito além do medo. Há desconfiança, raiva contida, submissão aprendida e momentos de silenciosa resistência. VIRTUOSAS é um filme que traz o terror como ferramenta de crítica social: desnuda estruturas de poder tão antigas que ainda assustam por continuarem vivas.
Crédito: Festival do Rio
VIRTUOSAS mistura humor, hipocrisia e vermelho em doses precisas
A própria casa, cenário principal do filme, se torna um espaço claustrofóbico, onde cada cômodo parece observar e julgar as personagens. O lar, que deveria representar segurança, vira uma prisão adornada com flores e cortinas impecáveis, refletindo a dualidade entre aparência e opressão.
Algumas atitudes da coach também geram indícios. É a velha hipocrisia de “fale o que eu digo, mas não faça o que eu faço.” Um retiro comum de mulheres cristãs vai se tornando estranho a cada frame. Para dar uma apimentada na história entra em cena também uma lenda, que vai se tornar o estopim para a perda do controle.
O roteiro é bem preciso, trazendo um humor sarcástico afiado, com temas bem contemporâneos e absurdos, zombando de fake news, questões anti-vacinas, entre outras.
Está curiosx? Vá assistir nos cinemas. Esse filme vale a pena ver na telona.
Tease Trailer de VIRTUOSAS
O filme VIRTUOSAS ganhou prêmio no Festival de Cannes
Além disso, o filme GANHOU o Goes To Cannes Award 2025. O filme foi produzido por Ana Paula Mendes e pela própria diretora.
Além de VIRTUOSAS, a diretora Cíntia Domit Bittar também levou outro filme de terror para a França: CASARÃO.
Por incrível que pareça, as virtuosas são reais
As seguidoras acreditam que a mulher deve encontrar realização no lar, no casamento e na maternidade, sendo submissa ao marido e responsável por manter a casa, cozinhar, cuidar dos filhos e “viver com graça e devoção”. Muitas se inspiram em ideais religiosos (principalmente cristãos), defendendo a ideia de que a mulher moderna perdeu seus valores ao buscar independência e carreira profissional.
Embora o discurso pareça inofensivo — com frases como “cada mulher deve escolher o que a faz feliz” —, ele reproduz estruturas patriarcais, reforçando que o lugar da mulher é restrito ao lar e à obediência masculina.
Esse tipo de movimento usa a aparência de escolha e empoderamento para mascarar o controle, pregando uma “virtude feminina” que, na prática, limita liberdade, autonomia e diversidade de papéis sociais.
